A (re)invenção do Jornalismo
Acabo de retomar a leitura do livro do jornalista, pesquisador e professor José Marques de Melo (1943-2018) - que tem o mesmo título desse artigo - para me preparar para escrever sobre a melhor profissão do mundo para um congresso latino-americano. Não poderia retomar num momento mais propício e quero compartilhar com você essa breve reflexão.
Faço isso porque tem gente ainda querendo me convencer que Jornalismo é qualquer outra coisa senão uma práxis cuja responsabilidade e ética são matéria-prima de seu processo. Jornalismo não vende (almas, imagens, e toda sorte de produtos comercializáveis). Jornalismo liberta e o valor de seu “produto” não é numérico.
Jornalismo liberta da ignorância, da desinformação, do ódio e da prisão política, social, cultural e, especialmente, econômica. Dessa forma, se tem gente vendendo, alienando, desinformando, comercializando mentes e corações, e dando o nome a essa prática de Jornalismo, fique atento. Que façam o que quiserem para ganhar dinheiro (se assim a consciência permitir), mas me chame para o debate antes de denominar de Jornalismo uma prática que não é.
Assim, não interessa gastar a mancha do papel com o que “não é”, mas sim, com “o que é”. E o próprio Jornalismo tem ferramentas para o processo de apuração que traz essa resposta.
O primeiro passo no processo de apuração de uma notícia é sempre a pergunta “o quê?”. É identificar o objeto da investigação, a notícia, que consiste no fato em si e suas diferentes versões. Processo jornalístico só se faz a partir daquilo que, verdadeiramente “é”, e não a partir daquilo que “gostaríamos que fosse”. Portanto, se a partir da investigação jornalística constarmos que o fato “é”, podemos seguir em frente. Se “não for”, vamos denominar essa prática de qualquer outra coisa, menos Jornalismo.
É fácil de entender: se uma informação falsa foi divulgada, ainda que por meio de um veículo de comunicação, não significa que tal prática é jornalística, pelo contrário, não é. Assim como em outras áreas do conhecimento, os profissionais falham, no entanto, o equívoco de uma pessoa não justifica o escracho da reputação daquela área profissional.
Buscar as respostas para outras perguntas como “quem?”, “quando?”, “como?”, “onde?” e “por quê?”, são os próximos passos da apuração jornalística. Quando não se tem essas respostas ou respostas são inventadas em troca de algo e uma informação circula, também não se faz Jornalismo, mas se pratica algo que poderíamos chamar de “@#%*!” (deixa pra lá, leitor, cada um é responsável por aquilo que cativa).
Neste cenário, o Jornalismo com J maiúsculo (como todas as demais ciências) se reinventa para combater o movimento da desinformação, pelo qual não é responsável. Ao contrário, é a única atividade profissional legítima que funciona no sistema contrário, checando e combatendo as falsas notícias.
Jornalismo informa e, consequentemente, liberta, pois possibilita que as pessoas pensem por si só e não tenham a mente cooptada por um sistema ou aprisionada em uma bolha. Para tanto, o Jornalismo sempre se (re)inventou no que diz respeito aos seus processos, mas nunca na finalidade.
Thaisa Bacco é jornalista e pedagoga. Mestre em Comunicação e doutora em Educação. É professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Escola de Comunicação e Estratégias Digitais da Unoeste (Universidade do Oeste Paulista).